Em decisão recente, o Supremo Tribunal Federal determinou que pertence aos estados, ao Distrito Federal ou aos municípios o montante arrecadado a título de IR retido na fonte, sobre valores pagos pelos entes federados, suas autarquias e fundações a pessoas físicas ou jurídicas contratadas para a prestação de bens ou serviços.
O recurso (RE) 1293453 teve repercussão geral conhecida, sendo o primeiro julgado pelo tribunal contra acórdão proferido sob sistemática de incidente de resolução de demandas repetitivas, uma das novidades do Código de Processo Civil (CPC) de 2015. Essa é a primeira vez que o Plenário julga um recurso extraordinário oriundo dessa sistemática.
O caso que deu origem ao recurso aconteceu em Novo Hamburgo (RS), onde o juízo da 1ª Vara Federal concedeu uma liminar impedindo a União de exigir do município de Sapiranga (RS) o valor arrecadado do IR incidente na fonte sobre rendimentos pagos às pessoas físicas e jurídicas.
Ocorre que, frente ao aumento de ações similares ajuizadas na Justiça Federal, demandando uma interpretação correta da forma de distribuição dessa receita, o juiz de primeira instância suscitou o IRDR perante o TRF-4. O objetivo, nesse caso, é buscar uma solução isonômica da matéria, dada sua relevância em âmbito geral.
Em seu julgamento, o TRF4 fixou a tese de que o artigo 158, inciso I, da Constituição Federal define a titularidade municipal das receitas. Contudo, no recurso apresentado ao STF, a União argumentou que apenas o produto da arrecadação do Imposto de Renda incidente na fonte sobre rendimentos pagos aos seus servidores e empregados deve ser atribuído aos municípios. Afirmou também que competia ao governo federal instituir o Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza, uma vez que o legislador constituinte originário não teve nenhum intuito de promover alterações no quadro de partilha direta.
Uma vez no STF, o presidente ministro Luiz Fux destacou que, caso a tese fixada pelo TRF4 fosse mantida, muitos municípios brasileiros seriam beneficiados com a receita oriunda do IR, razão pela qual sugeriu o reconhecimento da repercussão geral da matéria, sendo acompanhado pelos demais ministros. O ministro lembrou ainda que são muitas as ações em tramitação no TRF4 e no próprio STF que discorrem sobre a pauta.
O relator, ministro Alexandre de Moraes, votou pelo desprovimento do mérito do recurso. Para Moraes, o constituinte originário optou por não restringir expressamente a que tipo de “rendimentos pagos” se referia, ao estabelecer que pertence aos municípios o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, “sobre rendimentos pagos, a qualquer título”.
De acordo com o ministro, a literalidade da norma deve ser respeitada, como no caso da expressão “a qualquer título”, que demonstra a intenção de ampliar a abrangência do termo anterior (“rendimentos pagos”), submetendo-o a uma diversidade de hipóteses.
A alegada ofensa ao dispositivo constitucional que estabelece a competência da União para instituir o Imposto Sobre a Renda e Proventos de Qualquer Natureza também foi afastada por Moraes. Para o ministro, a previsão de repartição das receitas tributárias não altera a distribuição de competências, e sim a distribuição da receita arrecadada, uma vez que não influi na privatividade do ente federativo em instituir e cobrar seus próprios impostos.
Em resumo, o Imposto de Renda deve incidir tanto na prestação de serviços quanto no fornecimento de bens por pessoas físicas e jurídicas à administração pública, independentemente de ser ela municipal, estadual ou federal. Segundo o relator, com isso, os chamados “entes subnacionais” não devem ser discriminados quanto à possibilidade de reterem na fonte o montante correspondente ao IR, a exemplo do que é feito pela União (artigo 64 da Lei 9.430/1996).
Por fim, a tese de repercussão geral fixada pelo tribunal foi a seguinte: “Pertence ao município, aos estados e ao Distrito Federal a titularidade das receitas arrecadadas a título de Imposto de Renda retido na fonte incidente sobre valores pagos por eles, suas autarquias e fundações a pessoas físicas ou jurídicas contratadas para a prestação de bens ou serviços, conforme disposto nos artigos 158, I, e 157, I, da Constituição Federal.”